Vivemos num tempo de insegurança e isto aumenta e alimenta a nossa "neurose" quanto à possibilidade de revivermos situações que deixaram marcas profundas.
O medo ganha espaço entre nós. Lá fora, leem-se e veem-se cenas de violência a cada esquina, aproximando a possibilidade de uma reedição de um trauma em pensamentos disfuncionais que geram a ansiedade e o comprometimento à saúde. Paradoxalmente, certas violências ganham tons de normalidade.
Lembro de vários atendimentos a pacientes depois de terem sido assaltados e terem perdido seus pertences. Hoje, no entanto, sabemos de pessoas, todos os dias, que contam "tranquilamente" as vezes que foram assaltadas. Será que nos acostumamos à violência? Será que já não gera um dano psicológico às pessoas?
Bem, se por um lado torna real a hipótese de violência; por outro lado, tem sido comum quase todas as pessoas passarem por essa experiência de assalto e, para alguns, isso já não gera comprometimentos psicológicos maiores. Para outros, no entanto, essa vivência de violência pode sim acarretar sintomas significativos de possíveis prejuízos psíquicos graves.
Na clínica, o exercício da ressignificação do evento traumático por técnicas de revivência de experiências e técnicas da terapia cognitiva comportamental permite a nova organização do paciente. Pois, como mencionei acima, paradoxalmente, estamos nos deparando com pessoas que se acostumaram com a violência. Mas temos também muitos que chegam à clínica e se encontram, muitas vezes, num estado emocional bastante comprometido. Alguns já chegam com sintomas de TEPT (Transtorno de Estresse Pós-Traumático) instalado.
A instabilidade que vivemos hoje, bem como todo um contexto de insegurança, aguça o gatilho do Transtorno de Estresse Pós-Traumático ser instalado e desenvolver-se.
Reações emocionais como medo e revivência do trauma, estados de humor anedônicos ou disfóricos e cognições negativas, lembranças intrusivas e angustiantes são frequentes em pessoas com TEPT, assim como sintomas somáticos de taquicardia, pesadelos, crises de ansiedade, medo excessivo, etc.
Neste mundo, estamos sendo levados a tornar comum o que um dia fora causa de adoecimento. Ouvimos: "Isto é um assalto. Passe-me o celular". Tranquilamente a vítima o entrega e segue seu caminho. Por vivenciarmos tanta insegurança e ocorrência já nos acostumamos a viver no caos e não mais adoecer. Esse fenômeno do não adoecimento diante do trauma tem chamado minha atenção na prática clínica, pois o TEPT ainda existe sim, e muito! Porém tenho centrado a atenção na versão paradoxal, em que faço um questionamento: estamos a nos acostumar com tanta violência? Em parte sim. E parece que "é o que temos pra hoje", como me dizem os jovens a quem eu atendo.
Por: Karina Simões Moura de Moura
Instagram: @karinamourademoura